terça-feira, 23 de abril de 2013

Debate: As Fundações fazem mal à Saúde?

 

 

Publicado em: 23/04/2013 20:34:00

Debate: As Fundações fazem mal à Saúde?

Em 2010, o Centro Brasileiro de Estudos de Saúde (Cebes) realizou um seminário e publicou um livro* para debater e analisar os impasses da gestão do Sistema Único de Saúde (SUS), impregnado, nos últimos anos, de propostas e alternativas nem sempre comprometidas com os interesses públicos, em especial com os usuários do sistema.

Em tese, os gestores das instituições do SUS deveriam ter como objetivo tornar esse sistema universal mais efetivo, aumentando a capacidade de oferta de serviços e dando acesso aos cuidados integrais de saúde – isto é, atendendo ao conjunto das necessidades de saúde da sociedade.  

Entretanto, os caminhos para atingir os objetivos de gestão do SUS nem sempre estão abertos, sendo barrados por uma legislação não condizente com as necessidades e premências do setor da saúde.
Em resposta, os gestores do SUS vem realizando mudanças com a criação de novas modalidades de instituições gestoras não subordinadas à administração direta do Estado, entre as quais se destacam as organizações sociais (entes privados) e as fundações estatais (entes estatais). 

A estratégia de fuga da administração direta do Estado, que vem sendo adotada por elevado número de gestores estaduais e municipais de saúde, tem sido objeto de intensa polêmica entre os principais atores políticos do setor, envolvendo conflitos acirrados entre os gestores, trabalhadores e integrantes dos conselhos e confêrencias de saúde.

A defesa da administração pública do SUS ressalta a argumentação dos trabalhadores da saúde sobre instabilidade de vinculo empregatício e perda de direitos de servidores públicos, além da crítica compartilhada com os usuários sobre a ausência de mecanismos de controle social, não previstos nestas  Fundações.  A discussão precisa continuar para que se possam apontar soluções aos inegáveis problemas deparados pelos gestores que, ao mesmo tempo, não gere recuo nos princípios e conquistas do SUS

Com este objetivo, mais uma vez, o Cebes realiza novo debate sobre o tema, convidando especialistas, gestores, trabalhadores, usuários e quem mais desejar para expressar aqui sua opinião sobre os benefícios ou problemas causados pelas Fundações Estatais. Elas constituem, de fato, alternativa de uma gestão mais ágil e eficiente, ou não passam de arranjos privatizantes da gestão do SUS? Acompanhe diariamente novas opiniões, e não deixe de participar!

23/04/2013

 Maria Inês, Professora Associada da Faculdade de Serviço Social da UERJ; Pós-Doutora em Serviço Social pela UFRJ; integrante da Frente Nacional contra a Privatização da Saúde.

As fundações não são alternativas eficientes para a gestão do SUS. Segundo Granemann (2011, p. 52), as fundações estatais são formas atualizadas das parcerias público-privadas, das Organizações da Sociedade Civil de Interesse Público (OSCIP), das Organizações Sociais (OS), das Fundações de Apoio e de numerosas outras tentativas que sempre tentam repetir o mesmo – privatizar – sob emblema diverso para que a resistência dos trabalhadores seja vencida.

O essencial é que as reduções do Estado para o trabalho em nome da eficácia e da eficiência do serviço ao público, pela mesma medida, significam o aumento do Estado para o capital e é por isto que as denominamos privatização.

Algumas questões podem ser levantadas com relação a esta proposta, tendo por referência a saúde: as fundações serão regidas pelo direito privado; tem seu marco na contrarreforma do Estado de Bresser Pereira/FHC; a contratação de pessoal é por CLT, acabando com o RJU (Regime Jurídico Único); não enfatiza o controle social, pois não prevê os Conselhos Gestores de Unidades e sim Conselhos Curadores; não leva em consideração a luta por Plano de Cargo, Carreira e Salário dos Trabalhadores de Saúde; não obedecem as proposições da 3ª Conferência Nacional de Gestão do Trabalho e Educação na Saúde, realizada em 2006; fragiliza os trabalhadores através da criação de Planos de Cargo, Carreira e Salário por Fundações (Bravo & Menezes, 2011, p. 20).

Em síntese, pode-se afirmar que:

• As Fundações Estatais privatizam as políticas sociais;
• Não contribui para a formação do fundo público;
• A Fundação terá imunidade tributária.
• As Fundações Estatais prejudicam os trabalhadores;
• Contratação da força de trabalho pela CLT;
• Remuneração da força de trabalho subordinada ao contrato de gestão;
• Cada fundação terá o seu quadro de pessoal;
• As Fundações Estatais não valorizam o controle social. 

 Lenir Santos, doutora em saúde pública pela Unicamp e advogada.
A Fundação Estatal é uma entidade pública que integra a administração indireta do Estado, criada mediante autorização legislativa e está prevista no Decreto-lei 200, de 67 e na CF, art. 37, XIX. A partir de estudos iniciados em 2005 para a transformação do Grupo Hospitalar Conceição, situado em Porto Alegre, pertencente ao Governo Federal (para o qual fui contratada na ocasião), concluiu-se, com fundamentação jurídica, que seria viável elaborar um projeto de lei que pudesse dispor sobre a fundação estatal de maneira renovada, melhorando, assim, a gestão de serviços de saúde, em especial os hospitalares.

Naquele momento, o Ministério do Planejamento, passou a atuar no projeto da Fundação Estatal, o qual ficou sob a coordenação da servidora pública, Valéria Salgado. Foi elaborado um projeto de lei o qual foi encaminhado em 2007, PL 92, ao Congresso Nacional pelo Governo Federal.

Quais as inovações dessa categoria jurídica? A sua não dependência do orçamento público e sua vinculação ao órgão público supervisor mediante contrato de gestão o qual estabeleceria metas de gestão, qualidade, quantidade, eficiência, recursos financeiros e responsabilidade de seus dirigentes pela gestão.

Isso tornaria a fundação independente da lei de responsabilidade fiscal. Seu regime de pessoal CLT, com admissão mediante concurso, e a possibilidade de ter regulamento próprio de licitação e contratos. O conselho curador como o órgão de decisão pela autorização dos quantitativos de pessoal, salário e demais atos referente a pessoal.
Isso e outros atos tornam a fundação estatal uma entidade pública, cercada da necessária segurança jurídica, mas mais conforme as necessidades de gestão no mundo contemporâneo e em especial as da saúde composta por urgências, emergências, liminares judiciais e outras dificuldades da saúde.

A fundação estatal é uma forma de reestatização dos serviços públicos de saúde. Hoje contamos com muitas fundações estatais criadas pelos estados e municípios, num numero de mais ou menos 14. Podemos citar as primeiras delas que foram as três fundações estatais do estado de Sergipe, criadas em 2008. A fundação estatal da Bahia, Fundação Estatal Saúde da Família, instituída por 69 municípios baianos para gerir a saúde da família.

Temos ainda a fundação criada pelo município de Curitiba; três em Mato Grosso do Sul; uma em Porto Alegre e outras no interior do Estado.

Atualmente, com a decisão da AGU quanto à possibilidade de ser concedido às fundações o certificado de entidade beneficente de assistência social, sua gestão fica mais atraente.

Não se deve esquecer, também, que o Congresso Nacional votou o projeto de lei do Executivo o ano passado criando três fundações estatais: a FUNPRESP-EXE; a FUNPRESP-LEG e a FUNPRESP-JUD. As três fundações são fundações estatais.

Confira mais uma opinião amanhã!

22/04/13

Carlos Octávio Ocké-Reis, Economista, doutor em saúde coletiva pela Universidade do Estado do Rio de Janeiro (UERJ), e técnico de planejamento e pesquisa do Instituto de Pesquisa Econômica Aplicada (IPEA).

Como podemos superar determinados gargalos da administração pública federal, em busca da eficiência e da equidade das políticas de Estado, na área da saúde? O ministro da saúde, Alexandre Padilha, defende a aprovação do projeto de lei complementar, do poder executivo, que cria Fundações Públicas de Direito Privado para o setor saúde (PLP 92/07). Mas isso significa publicizar o mercado ou mercantilizar o estatal?

Seu objetivo é criar instituições públicas híbridas (“quase-mercado”) que concorram com o setor privado em nível federal, estadual e municipal. Contudo, por sofrer resistência da sociedade civil organizada, inclusive, do próprio Conselho Nacional de Saúde – que considera essa proposta inconstitucional e privatista no âmbito do Sistema Único de Saúde (SUS) – parece necessário refletir se tal projeto das fundações se afasta ou não do estatuto de cidadania pressuposto na Constituição de 88.

Considerando a necessidade de se construir um modelo de sociedade que supere o subdesenvolvimento e a dependência da economia brasileira, nos parece que uma coisa é propor que hospitais privados se tornem empresas públicas; outra é propor que hospitais públicos sejam, de um lado, organizados a partir de uma combinação técnica de indicadores econômicos, epidemiológicos e clínicos, e de outro, instrumentalizados para atrair a clientela de medicina privada.

Ademais, apenas para problematizar uma dimensão operacional da proposta, como medir (o trabalho é o produto trocado) e valorar (eficiência deve ser mensurada pela eficácia do tratamento) a produtividade do trabalho na produção das ações e serviços de saúde?

A meu ver, entretanto, a questão de fundo reside em outro lugar: boa parte dos problemas de gestão do SUS decorre da sua crise crônica de financiamento, e, portanto, a adoção de medidas de eficiência não pode servir de base para se cortar o nível de recursos financeiros ou organizacionais do SUS, tampouco para subtrair o caráter público da sua gestão.

Somos contra a corrupção e os desperdícios, mas qual município não perde capacidade de gestão diante das imposições da Lei de Responsabilidade Fiscal? A melhoria da eficiência pode, na realidade, significar e exigir o aumento dos gastos, em especial se o objetivo do governo federal for induzir a concorrência regulada no setor hospitalar. Nesse caso, existe uma variável estratégica para incrementar o papel do Estado nesta disputa: a qualidade dos profissionais de saúde e a racionalidade administrativa de seu regime de trabalho.

Desse modo, embora seja meritório discutir o nível salarial e formas diferenciadas de remuneração, a carreira dos profissionais de saúde, nas três esferas de governo, precisa antes ser vista e enquadrada – fustigando a medicina liberal, o empresariamento médico e as terceirizações do SUS – enquanto carreira de Estado, à luz das normas do Regime Jurídico Único (RJU).

O SUS deve assim disputar hegemonia com mercado, mas não podemos, no plano das instituições do Estado, fragilizar o direito público (social) subjacente ao estatuto da cidadania, sob o pretexto de driblar a lei de licitação ou qualquer outra forma de controle público.

Precisamos, a um só tempo, fortalecer a gestão pública, inovar no campo do direito público e alargar a participação social, criando melhores condições institucionais para gerenciar o sistema e os serviços públicos do SUS, em direção à valorização do servidor público e à superação da hegemonia social-liberal – que tem no artigo 199 da Constituição, que reza que a saúde é livre a iniciativa, um ponto de apoio significativo, que fragiliza a noção que a saúde é um direito de todos e um dever do Estado.

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*Livro Gestão Pública e Relação Público Privado na Saúde, organizado por Nelson Rodrigues dos Santos e Paulo Duarte Amarante. Texto de introdução baseado em editorial.

geniberto paiva campos

observatório da saúde/df

22/4/2013
20:26h

enquanto não se desfizerem as amarras do estado brasileiro, que o impedem de funcionar plenamente haverá essa interminável discussão sobre esses entes espciais do serviço público. Tem que se revisar a Lei de Responsabilidade Fiscal, por exemplo. Feita pelas mãos hábeis dos neoliberais. Eis a questão. Está aí, talvez uma das CAUSAS da baixa eficiência do SUS.

Fonte: http://www.cebes.org.br/verBlog.asp?idConteudo=4355&idSubCategoria=56

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